14 de mai. de 2008

CRONICAS 8

Sempre fui um cara pacato. Detestava brigas. Mas tudo tinha exceção. E eu não fugia à regra. Se fosse necessário dar uns sopapos na cara de algum infeliz, eu daria. Nunca fui do tipo atlético. Quando eu era criança, por exemplo, eu tinha um maldito corpo magricela. Mas sempre fui ágil. Se eu começasse a dar socos, ninguém desviava. Se viessem me socar, eu normalmente desviava e corria. Ninguém me pegava. Eu chamo isso de ser ágil. Outros chamam isso de ser covarde.
Como eu fazia a 3ª série do ensino fundamental à tarde, as minhas aulas só terminavam de noite. E se você quisesse fazer alguma atividade física extra classe, ela começaria às 18h30 e terminaria uma hora depois. E no meu caso, eu tinha que esperar esse tempo nas terças e quintas, porque meu irmão fazia football. Eu normalmente sentava nas arquibancadas da quadra e esperava o treino terminar enquanto conversava com meus amigos Gordo e Tiago. Eram caras legais.
Era uma terça feira, 18h40. Estava eu, o Gordo e Tiago conversando na quadra esperando o treino terminar. Foi aí que algo terrível aconteceu. Me senti estranho. Minha boca estava seca. Minha cabeça doía. Minha glicose estava provavelmente baixa. Estava suando frio. Meu estômago parecia que estava se espremendo.
- Maldição! – eu disse – Estou com fome.
Lembrei logo que tinha trazido biscoitos Negresco num pote de plástico para o lanche. Peguei minha mochila e fui atrás dos meus biscoitinhos. Adorava biscoitos Negresco. Achei o pote.
- Maldição! – disse mais uma vez – Só sobraram três.
Malditos. Nem ouviram minhas reclamações. Tudo bem. Por causa disso não ofereci sequer uma lasquinha de um dos biscoitos. Eu era mau.
Quando já estava terminando o terceiro biscoito, o Gordo olha pra mim.
- O QUE?! NEGRESCOS?! – ele perguntou.
Dei a última mordida restante e disse:
- Pois é. Pois é. Eram Negrescos sim.
- Seu miserável. – ele disse enquanto se levantava e me olhava com olhos sanguinários.
Corri.
Ele correu atrás de mim.
Tiago correu também. Disse que precisava rir.
Minha escola era interessante. Estudava lá desde o maternal, por isso a conhecia com a palma de minha mão. Pena que o Gordo também conhecesse. Saindo da quadra tinha um corredor de pedrinhas com uns canteiros no meio. Era feio. E brega. Tinha uma passarela de concreto para que as pessoas não pisassem nas pedras. Corri pela passarela. As pedras iam me atrapalhar. A passarela dava direto com a cantina. Era ótima ela. Sempre comprava um kinderovo lá. De frente para ela tinham umas mesas e cadeiras típicas de lanchonete americana. Passei correndo sem olhar para trás. Depois vinham os quiosques. Conseguiam ser mais feios que as pedrinhas e os canteiros. E mais bregas também. Eram três no total, enfileirados. Corri por eles fazendo uma espécie de zig-zag. Passei pelo portão menor e cheguei ao pátio principal da escola. Era lá que ficavam a portaria e a secretaria. Lugar sem graça. Só fazíamos brincar de cuscuz lá. É que o piso era quase todo de areia. Perfeito para brincar de cuscuz. Corri loucamente por lá fazendo uma terrível nuvem de areia. Entrei no espaço do pré-escolar. Era vazio à noite e tinha brinquedos interessantes. Pensei em me esconder na velha casinha de criança. Desisti. Estava cheia de morcegos. O pré-escolar inteiro estava cheio de morcegos. Por isso que era tão vazio à noite. Olhei para trás.
- Maldito gordo! – eu pensei.
Ele estava a poucos passos de mim. Sem pensar duas vezes dei a volta no escorrego e refiz todo o caminho no sentido contrário. Se eu não o conhecesse, pensaria que ele estava levando aquilo a sério. Passei pelo pátio principal, pelos quiosques feios e bregas, pela cantina e suas mesas americanas e pelas pedras e canteiros até chegar finalmente na quadra. Parei. Não agüentava mais correr. Subi dois degraus da arquibancada. Tiago chegou logo depois e também subiu dois degraus. Rimos juntos. Ouvi os passos do Gordo.
- Hei, Gordo! Ta bom já. Agüento mais não. – eu disse – Vamos dar uma descansada. Depois continu...!
Droga. O Gordo chegou pulando em cima de mim. Se eu não o conhecesse, pensaria que ele estava levando aquilo a sério. Caí no degrau de concreto. O Gordo caiu em cima de mim.
- Hei, Gor...!
Antes que eu dissesse algo, ele sentou em cima de minha barriga, me tirando o ar, e agarrou meus cabelos. Olhei para Tiago. O maldito estava rindo. Se eu não conhecesse o Gordo, pensaria que ele estava levando tudo muito a sério.
- Hei, po. Tá bom já. Vamos pa...!
Ele chocou minha cabeça contra o concreto. Maldito. Pensava que o conhecia.
Dei logo um gancho de direita na sua bochechona. Me senti batendo num travesseiro.
- Que massa. – eu pensei.
Ele chocou meu crânio novamente contra o concreto. Maldito. Ele estava realmente levando aquilo a sério. Soquei novamente sua bochecha. E continuei socando alternando os punhos. Parecia que estava treinando boxe.
- Que da hora. – eu pensei.
Tenho que controlar melhor meus pensamentos.
Ele bateu minha cabeça no concreto outra vez. Estranho. Não ouvia mais a risada de Tiago. Não ouvia mais o barulho que as chuteiras dos jogadores faziam no piso da quadra. Não ouvia mais os gritos do técnico. Tudo estava parado. Não. Vi Tiago descendo a arquibancada pra ir chamar o técnico. Estranho. As luzes se apagaram. Não. Minha visão que estava turva. Me senti estranho. Minha cabeça doía. Minha boca estava seca. Minha glicose provavelmente estava baixa. Estava suando frio. Meu estômago se retorcia. Droga. Estava novamente com fome.
- AHHHHH! – a dor da pancada veio e eu gritei.
Tiago havia chamado o técnico, que chegou em poucos segundos para segurar o Gordo. Tiago me ajudou a levantar. Passei a mão na minha nuca para checar o estrago. Não sangrava. Que bom.
O treino terminou ali. Não sei que horas eram. Provavelmente não eram 19h30 ainda, pois meu irmão estava puto comigo e dizendo que eu tinha atrapalho seu treino. Ele era um maldito mesmo. Ao chegar em casa, tomei um banho e dormi.
Era quarta-feira. 13h30. Estava no colégio e a aula já ia começar. Dessa vez eu decidi comprar o lanche na cantina. O Gordo chega.
- Olá. – ele diz para mim.
- Olá. – eu respondo.
- Como estão as coisas?
- Estão boas. E contigo?
Tiago chega.
- Opa opa. E aí caras?
- E aí, Tiago. – eu digo.
- Ohopa, Tiago. – o gordo diz.
- Prontos para mais um dia de aula? – Tiago pergunta.
- Jamais. – eu digo.
Rimos juntos. Os três.

4 comentários:

A burguesia fede! disse...

shaushuauhsuha
essa eh de verdade!?
sim tem uma parte q vc coloca
futball, n quis dizer futsal?
gostei..

laura disse...

massa!! massa mesmo.
cochilei e já perdi duas crônicas..
!!!!!

Salomão Ritilhos disse...

Mél Déls, KinderOvo é a minha infância.
Uma boa máquina do tempo essa Cronica 8. Tu podias começar a dar títulos a elas né.
Liked alot.

Adriano05 disse...

Cacete...
Não conhecia esse seu lado Apollo Creed... =D
Fora que sua cabeça deve ser blindada pra aguentar tanta porrada...
E teu abdômen devia ser de concreto pra aguentar o Gordo...

Raul,uma máquina de matar...
Pena que não era mais mortal que O Gordo...nem deve ser agora...porque o Gordo agora tá uma montanha de músculos... =D