28 de abr. de 2008

CRONICAS 5

Certa vez fui ao dentista. Eu o adorava. Eu precisava extrair meu canino de leite, porque o fixo já estava pra nascer. A consulta era às 8h, cheguei dez minutos antes para aproveitar o lugar. Era ótimo. Tinha dois sofás bregas de couro preto e quatro assentos, uma mesinha, no centro da sala, cheia de revistas e uma televisão suspensa no teto por peças de metal. Mas o melhor do local estava atrás do sofá brega que ficava de frente pra entrada. Era uma parede revestida por tacos de madeira. Adorava aquela parede. Se você olhasse bem para ela, notaria a porta secreta. Era uma porta, também revestida por tacos, sem maçaneta. Sempre quis saber aonde ela levaria. Até hoje eu não sei.
Oito horas. Hora da consulta. A auxiliar me chama e eu entro na salinha. Arght! Um cheiro inebriante de flúor, como se tivessem derramado galões dessa substância no chão. Tentei não pensar nisso ou terminaria vomitando. Atrás do birô estava ele, o meu dentista. Sujeito estranho. Tinha uma narina bem maior que a outra. Era um cara legal. Fomos para uma sala ao lado, onde tinha todas aquelas parafernálias de dentistas. Sentei-me na cadeira. A consulta começou.
A primeira coisa que ele fez, foi começar com aquele papo de escovação, pegou uma escova nova, melecou ela naquele maldito flúor e escovou meus dentes. Depois passou o fio dental com força o suficiente para sangrar minha gengiva e dizer que meus dentes estavam mal escovados. Chegou a hora da extração.
Primeiro ele passou uma pomada anestésica e disse que era pra poder aplicar a anestesia local. Não entendi o porque da pomada. Então, chegou a hora da anestesia local. A auxiliar deu a ele uma seringa com o anestésico.
- PUTA MERDA! – eu disse.
Ao ver o tamanho da agulha foi que eu entendi o porque da pomada.
Depois da seringa, ele encheu minha boca com algodão. Havia muitos algodões. Me perguntei para que tantos. Então ele me disse:
- Vou começar a extração. É simples. Girarei seu dente até que ele solte da gengiva.
Percebendo meu olhar temeroso, ele disse:
- Não se preocupe, apliquei uma anestesia no local. Mas se doer é só você falar “pára” que eu pararei, darei um tempo para você se recompor e então prosseguirei com a extração. Ok?
Acenei com a cabeça.
Ele segurou meu dente e começou a girar. Agüentei o máximo que pude e então fui pedir para parar:
- PFÁFA! PFAUFA!! PFAFAUF!!
Agora eu entendi o porque de tantos algodões.
Bati três vezes na cadeira, igual aos lutadores de luta livre. Não parou. Tentei segurar sua mão. Não parou. Chamou a auxiliar e ela me segurou. Tudo ficou escuro e a dor já não mais importava. De repente, o alívio. Tudo ficou claro novamente e eu pude ver meu dentista segurando o canino de leite. Levantei-me da cadeira e saí da sala.
A sala de espera não mais me encantava. Porta secreta idiota. Minha mãe pagou a consulta e fomos embora. Maldito dentista e suas narinas estúpidas.

27 de abr. de 2008

CRONICAS 4

Eu sofri muito nas mãos do meu irmão. Quando eu completei 13 anos, eu percebi que o corpo esquelético do meu irmão não era mais páreo para mim. Decidi então que não mais agüentaria suas piadinhas indigestas. Fiz um teste. Resolvi tirar uma onda com os seus cabelos cacheados duros que não viam a cara de um xampu há dias. Ele não gostou. Ficou gritando e me xingando. Então, eu calmamente me levantei do sofá e caminhei em sua direção. Ele foi movendo seu corpo magro para trás. Quando eu o encostei em uma parede e ele não tinha mais para onde ir, eu disse:
- Seu merda! Quer tirar onda comigo?! Tire! Mas da próxima vez que você estilar com alguma brincadeira minha, eu vou esmagar sua cara.
Meu irmão nunca mais tirou onda comigo. Que pena.

26 de abr. de 2008

CRONICAS 3

Meu irmão adorava me fazer sofrer. Ele é cinco anos mais velho que eu. Certa vez, eu estava brincando sozinho em nosso quarto, deitado sobre minha cama cor de vinho, quando meu irmão entrou, pegou uma de minhas revistas em quadrinhos e disse:
- Ela agora é minha.
Ao terminar de falar fez um sorriso maligno que mostrava todos os seus dentes, que por sinal tinham um amarelado de quem não os escovava a uns 3 dias. Com toda a sabedoria que eu tinha aos 10 anos, eu calmamente disse:
-Foda-se.
Depois disso fiquei calado e voltei a brincar com meus bonecos dos X-Men. Ao ver minha indiferença, meu irmão começou a gritar coisas sem sentido e eu fiquei sem entender o que estava acontecendo. Até que, num certo momento, ouvi o trinco da porta fazer um barulho, o que indicava alguém tentando entrar, e então meu irmão diz para “mim”:
-PARA! Quero discutir contigo não.
Nesse momento a porta do quarto abre, meu pai aparece e sem pensar duas vezes meu pai me olha com um olhar mortífero.
Compreendi duas coisas nesse dia. Meu irmão realmente gostava de me fazer sofrer e uma bronca do meu pai dói mais que uma surra.

25 de abr. de 2008

CRONICAS 2

Acho que não sou confiável. Ao menos, essa é a impressão que meu pai sempre me causou. Certa vez, quando eu tinha oito anos, estava eu e meu irmão e meu pai assistindo à um programa na nossa velha televisão SHARP. Em um certo momento eu me levantei para pegar um copo d’água, foi quando eu senti os pés do meu irmão impulsionando meu corpo para frente. Dei de cara com a parede. Tomado por uma fúria momentânea pensei em voar para cima do meu irmão, mas resolvi questionar meu pai por uma atitude de sua parte. Ele pegou um de seus cigarros Marlboro, acendeu-o, deu uma enorme tragada e soltou uma auréola de fumaça em minha cara. Não entendi sua reação. Quando ele percebeu minha indiferença, plantou-me olhos de ira e gritou para mim:
- E VOCÊ NÃO TINHA FEITO NADA À ELE?! EU BEM NÃO TE CONHEÇO?!!
Acho que não sou confiável. Ao menos, meu pai não confia em mim.

24 de abr. de 2008

CRONICAS 1

Meu pai mente. Acho que ele gosta disso. Ele passa as noites acordado fumando seus cigarros Marlboro e assistindo a filmes idiotas na televisão só para contar às pessoas que se precisarem ligar, liguem de noite, porque ele passa as noites acordado pintando. Ele deve sentir prazer com isso, pois faz 10 anos que ele não pinta nenhum quadro. Quando alguém liga pra ele pra oferecer a assinatura de uma dessas revistas alienadoras, ele começa a puxar assunto. Normalmente, quando alguém recebe uma ligação dessas, desliga imediatamente o telefone. Meu pai não. Ele simplesmente encosta-se à mesa, pondo seu peso sobre ela, acende um de seus cigarros Marlboro e começa a dizer uma mentira após a outra sobre o porque de não querer assinar tal revista e como era de se esperar dos atendentes, eles não desistem e ficam tentando convencer meu pai a assinar. E o meu pai conta mais mentiras. E os atendentes insistem mais. Até que meu pai fica irritado e manda o atendente tomar no cú e desliga o telefone. Acho que meu pai gosta de ficar irritado e de mandar as pessoas tomarem no cú.